Sinopse Suma: Dois anos após a morte do marido, Lisey Landon decide que é hora de colocar os papéis dele em ordem. Afinal, Scott Landon era um escritor de sucesso, e há diversas partes interessadas em qualquer trabalho inédito deixado por ele, embora ela esteja determinada a recusar qualquer oferta. Casados por vinte e cinco anos, os dois compartilhavam de uma intimidade profunda e muitas vezes assustadora. Logo no início do relacionamento, Lisey descobriu de onde Scott tirava suas ideias – um lugar capaz de curá-lo ou devorá-lo, chamado Boo’ya Moon. Quando é contatada por Zack McCool, um homem desagradável que diz que ela deve entregar os manuscritos ou sofrer as consequências, chega a vez de Lisey encarar os demônios que assombravam Scott – e que agora podem ajudar a protegê-la. Assim, o esforço de uma viúva para organizar o escritório de seu célebre marido se transforma em uma jornada quase fatal ao mundo sombrio que ele habitava.  (Resenha: Love – A História de Lisey – Stephen King)

Opinião: A História de Lisey talvez seja o livro mais difícil que já tive que resenhar. Porque ele reúne uma quantidade imensa de qualidades, explora diversos temas, toca em feridas e com maestria e sensibilidade fala sobre amor e luto. Eu já havia escrito sobre Joyland que Stephen King é um poeta quando decide percorrer os caminhos do drama. Com este livro não é diferente. Para muito além da parte tenebrosa, ou elementos de terror se preferirem, o que encontramos nesta obra é uma reflexão profunda sobre o “seguir em frente” e sobre os demônios que nos afetam intimamente e que ninguém é capaz de entender ou curar.

Love – A História de Lisey fala, primeiramente, sobre um casamento em que o amor imperava. Havia paixão de sobra no relacionamento entre Scott e Lisey. Mais do que isso, havia cumplicidade, parceria e havia também aquela segurança de que ambos, juntos, superavam qualquer desafio. Para Scott, principalmente, por ter em Lisey sua âncora, a luz que iluminava os caminhos sombrios da sua mente e que o salvava dos momentos em que sua sanidade ficava por um fio.

Em outro aspecto, Love aborda também o luto. Como Lisey precisa enfrentar e assimilar o fato de seu Scott não está mais presente. Para isso, ela vai remexer no seu escritório. Fazer a limpeza e ter contato palpável com a ausência. É aí que muito do passado volta à tona em lembranças de bons e péssimos momentos. É onde ela começa a fazer o balanço de uma relação e entender, aos poucos, que chegou a hora de seguir adiante.

Costurando tudo isso, há um mundo obscuro à parte. O mundo dos pesadelos, dos traumas de infância, da lagoa onde Scott vai beber e pescar palavras que alimentam seus livros. Esse mundo perdido nos confins da imaginação de Scott, ao qual Lisey vai ter acesso, é um pouco daquela zona sombria em que todos nós nos refugiamos. É o nosso universo particular onde as coisas costumam ser da forma como queremos. Mas é onde também habitam nossos monstros, os “garotos espichados” que ficam à espreita aguardando o momento de tomarem o controle.

A História de Lisey é isso. Uma trama complexa e difícil de ser resenhada ou explicada. Ela precisa ser lida. Porque a partir das recordações de Lisey, que vão se alternando com o presente, conhecemos o casamento movido pelo amor, mas também desvendamos os tormentos de Scott, que poderiam ser associados a uma doença mental. Enxerguei metáforas a perder de vista durante essa leitura. Sobre os limites da sanidade, sobre o que os traumas de uma criação violenta na infância podem produzir, sobre feridas não cicatrizadas, sobre a certeza de que mais dia menos dia “aquela coisa vai nos alcançar e tomar o controle” do nosso pensamento e vamos sucumbir. Boo’ya Moon, pra mim, é isso. O mundo em que cada um de nós se refugia e que tem as nossas cores, as nossas características e os nossos perigos. E que, se nos entregarmos totalmente à sua sedução, podemos sair da realidade (ou da sanidade).

Como complemento, vale destacar que há um vilão a ser enfrentado, um homem que quer (quer mesmo?) os manuscritos não publicados de Scott. Há a irmã de Lisey, Amanda, que sofre de um problema similar ao de Scott. E há uma espécie de jogo, uma didiva, para usar o termo do livro, deixada por Scott para que sua viúva encontrasse e pudesse entender como seguir adiante sem ele. Os toques sobrenaturais são apenas isso, passagens que ajudam um pouco a completar a história. Mas tentem não se deixar levar ao pé da letra por nada. Como eu, enxerguem as metáforas. Aposto que a riqueza da história vai ficar maior para vocês. E entendam o mundo sombrio de Scott como o mundo que cada um de vocês também têm.

Apontado por Stephen King como seu livro favorito, A História de Lisey tem muito da intimidade de um autor de sucesso, talvez inúmeros traços autobiográficos, e sua relação de amor com a esposa. É uma poderosa história sobre relações humanas como poucas vezes li. E tem a vantagem de ser narrada por aquele que considero um dos maiores contadores de histórias do mundo.

Porque a forma como Stephen King nos transporta para suas tramas, nos faz íntimos de seus personagens e captura nossa atenção a partir das mais corriqueiras cenas é deliciosa. Ele sabe como poucos nos envolver na sua narrativa. E A História de Lisey é isso. É nos envolvermos com a história de uma mulher, forte, apaixonada, um pouco assustada, e que ainda carrega uma imensa saudade do seu companheiro. É entender muito do passado, superar uma ausência (superar, jamais esquecer) e olhar para a frente.

Um tanto quanto ignorado ou posto em segundo plano pelos leitores, Love – A História de Lisey é um dos melhores livros de Stephen King. Merece tranquilamente o Top 5. Mas merece ser lido com calma, sem pressa e sem expectativa de sustos ou cenas de gelar a espinha. Trata-se de um drama com toques de sobrenatural. Uma história de amor, de um casamento e de um escritor atormentado. Mas sobretudo, a história de Lisey e os caminhos tenebrosos da imaginação.

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Curiosidades: Entre as muitas conexões e citações com outras obras, em determinado trecho do livro é citado o escritor Michael Noonan. Ele é o protagonista do livro Saco de Ossos.

O vice-xerife Andy Clutterbuck aparece, entre outros, no livro Trocas Macabras.

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Do Autor leia também:

Conto de Fadas

Billy Summers

Depois

Com Sangue

O Instituto

Outsider

A Pequena Caixa de Gwendy

Revival

Joyland

Novembro de 63

Love – A História de Lisey

Trocas Macabras

A Metade Sombria

Misery

A Maldição

A Hora do Lobisomem

O Cemitério

Christine

Quatro Estações

O Concorrente

Cujo

Dança Macabra

A Autoestrada

A Incendiária

A Longa Marcha

 ‘Salem

Carrie

N.

Creepshow

O Autor: Stephen King nasceu em 1947 em Bangor, no Maine. É autor de mais de cinquenta best-sellers no mundo inteiro e mais de 200 contos, sendo reconhecido como um dos mais notáveis escritores de contos de horror fantástico e ficção de sua geração. Os seus livros já venderam mais de 400 milhões de cópias, com publicações em mais de 40 países. Muitas de suas obras foram adaptadas para o cinema. É o nono autor mais traduzido no mundo.

Stephen King recebeu em 2003 a medalha de Eminente Contribuição às Letras Americanas da National Book Foundation; em 2007 foi nomeado Grão-Mestre dos Escritores de Mistério dos Estados Unidos; e em 2015 recebeu do presidente Barack Obama a National Medal of Arts por “sua combinação de narrativa notável e análise precisa da natureza humana, com trabalhos de terror, suspense, ficção científica e fantasia que, por décadas, assustaram e encantaram públicos de todo o mundo”.

Ele mora em Bangor, no Maine, com a esposa, a escritora Tabitha King.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

2 COMENTÁRIOS

  1. Se o livro é muito bom, a resenha não falha em capturar o essencial da obra. Parabéns pela resenha, e sei que já ficou claro através dela, mas fica aqui a ratificação de que é um livro excelente, quase que uma experiência nova para quem está disposto a ler alguma coisa mais incomum.

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