Sinopse Suma: Contrariando a vontade da mãe, o jovem Ray Garraty está prestes a participar da famosa prova de resistência conhecida como A Longa Marcha, que presenteia o vencedor com “O Prêmio” ― qualquer coisa que ele desejar, pelo resto da vida. No percurso anual que reúne milhares de espectadores, cem garotos devem caminhar por rodovias e estradas dos Estados Unidos acima de uma velocidade mínima estabelecida. Para se manter na disputa, eles não podem diminuir o ritmo nem parar. Cada infração às regras do jogo lhes confere uma advertência. Ao acumular mais de três penalidades, o competidor é eliminado ― de forma “permanente”. E não há linha de chegada: o último a continuar de pé vence. (Resenha: A Longa Marcha – Stephen King)
Opinião: Já escrevi em outras resenhas que Richard Bachman é o lado sombrio de Stephen King. Porque suas histórias, principalmente seus finais, são desprovidos de qualquer esperança de algo melhor. Bachman não tem fé nenhuma na humanidade e, acredito eu, espera muito pouco ou quase nada dos seres humanos em termos como compaixão, redenção, perdão etc. etc. King já tem um considerável número de finais felizes ou otimistas em muitas de suas obras mais sangrentas e aterrorizantes. Porque ele acredita que há uma luz no fim do túnel. Por mais fraca que possa parecer.
Integrante daquilo que se convencionou chamar de Os Livros de Bachman – composto por quatro obras, A Longa Marcha é o primeiro livro escrito por Stephen King, embora Carrie tenha sido o primeiro a ser publicado. E ele traz exatamente algumas das características que coloquei acima. Não há muita humanidade em seus personagens e a trama é brutal em toda a sua concepção.
A Longa Marcha tem um mote levemente parecido com outro d’Os Livros de Bachman, O Concorrente. Ambos, guardadas suas muitas diferenças, tratam de jovens disputando a própria vida em uma espécie de reality show do apocalipse. Vejam bem, o mundo apresentado na obra é distópico e as pessoas que vivem ali são desprovidas de qualquer traço de racionalidade. Ok, talvez algumas ainda conservem alguma centelha, mas no geral, a sede de sangue e a ânsia pelo sofrimento alheio predominam.
E do que trata essa longa marcha? É um jogo em que cem garotos são colocados para caminhar pelas estradas dos Estados Unidos. Há uma velocidade mínima que eles precisam manter e eles não podem parar para absolutamente nada e nem caminhar abaixo dessa velocidade. Portanto, comer, defecar, mijar, cochilar precisam ser feitos de forma a se manter em movimento dentro dessa velocidade mínima. Só isso! Se você parar para descansar ou porque uma câimbra te pegou de jeito… Bom, há uma tolerância de poucos segundos até você retomar a caminhada ou ser abatido. Vence aquele que permanecer vivo até o fim!
“Olhavam para a estrada com uma espécie de fascinação horrorizada, como se fosse uma corda bamba na qual tinham que andar para atravessar um precipício infinito, sem fundo.”
Bachman, ou King, focam sua narrativa em um personagem, Ray Garraty. É através dele que vamos seguir essa jornada e nos relacionar e conhecer os demais competidores. Todos os garotos são inocentes demais para entenderem a dimensão do problema em que se meteram. Mas suas histórias vão aparecendo e vamos tendo vislumbres de sonhos e ilusões. E não há mais nada além disso. Cada capítulo é uma sequência dessa marcha à medida que competidores vão ficando pelo caminho e as forças são colocadas à prova.
A narrativa é viciante é o livro nos consome na leitura, mesmo não apresentando nada fora do comum dessa caminhada. Não se trata de terror, mas de um grupo de meninos colocados numa situação extrema – algo muito comum na obra de Stephen King, para tentarem sobreviver. Às margens dessa marcha a população acompanha sedenta, indo à loucura quando há uma queda e sua eliminação. Imagino que o Twitter de 2023 seria o palco perfeito para espectadores de uma longa marcha. A sede de sangue é a mesma!
A Longa Marcha é um drama de sobrevivência. Caminhar sem fim até só restar você. Encarar medos, traumas, sonhos, exaustão, lembranças simples que vêm à mente ao acaso. E tentar, dentro do possível, estabelecer uma mínima relação social com o companheiro que também é adversário sabendo que se você cair, ele não vai te ajudar. E que a qualquer momento, ele, ou você, podem ficar para trás. Para sempre.
“Os mortos são órfãos. Não têm companhia além do silêncio como uma asa de mariposa. Um fim à agonia do movimento, ao longo pesadelo de seguir pela estrada. O corpo em paz, imobilidade e ordem. A escuridão perfeita da morte.”
É impossível não sofrer uma verdadeira tortura mental ao longo das páginas desse livro. Porque ele sufoca em níveis diversos. Tanto da mente que vaga aleatória nos momentos em que você se entrega aos devaneios e apenas movimenta suas pernas no automático, quanto em manter a frieza de tecer papos, fazer confissões, trocar ideias e no minuto seguinte seguir em frente enquanto a pessoa com quem você falava simplesmente não aguentou mais. Nesse aspecto a amizade e relação de Ray com McVries constituem alguns dos momentos ais tocantes e emocionantes da história. Os dois garotos se mantêm num laço muito forte que é a única centelha de humanidade em toda a história. e que tem, logicamente, seu fim.
A Longa Marcha é um livro para ser devorado e que consegue nos deixar angustiados por um bom tempo após a leitura. É certamente um dos melhores da leva de Bachman e não foge nem um pouco ao estilo sádico e pessimista que caracteriza o alter ego de King. E lembrem-se… “não é porque que acontece em um mundo que não existe que é (apenas) um conto de fadas.”
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O Autor: Stephen King nasceu em 1947 em Bangor, no Maine. É autor de mais de cinquenta best-sellers no mundo inteiro e mais de 200 contos, sendo reconhecido como um dos mais notáveis escritores de contos de horror fantástico e ficção de sua geração. Os seus livros já venderam mais de 400 milhões de cópias, com publicações em mais de 40 países. Muitas de suas obras foram adaptadas para o cinema. É o nono autor mais traduzido no mundo.
Stephen King recebeu em 2003 a medalha de Eminente Contribuição às Letras Americanas da National Book Foundation; em 2007 foi nomeado Grão-Mestre dos Escritores de Mistério dos Estados Unidos; e em 2015 recebeu do presidente Barack Obama a National Medal of Arts por “sua combinação de narrativa notável e análise precisa da natureza humana, com trabalhos de terror, suspense, ficção científica e fantasia que, por décadas, assustaram e encantaram públicos de todo o mundo”.
Ele mora em Bangor, no Maine, com a esposa, a escritora Tabitha King.