Sinopse Record: Em uma cidade industrial cinzenta e chuvosa na década de 1970, a polícia concentra todos os seus esforços em acabar com o tráfico de drogas e a violência, bem como a criminalidade que decorre disso. Duncan, o novo comissário-chefe, é um idealista e um visionário, a favor de uma gestão transparente e engajado na luta contra qualquer forma de corrupção. Ele é um sonho para a população. E um pesadelo para os criminosos. A missão da polícia não é nada simples. O mercado de drogas da cidade é comandado por dois homens – Sweno, líder de uma perigosa gangue, e Hécate, um mestre da manipulação, que tem ligações com as esferas mais elevadas do poder. Mas Duncan tem uma poderosa arma: Macbeth, o chefe do Grupo de Operações Especiais, um homem do povo. E também uma pessoa ambiciosa, influenciável e com tendências paranoicas e violentas. E, o que muitos não sabem, um ex-viciado. Uma presa fácil para Hécate. Quando uma operação para apreender um carregamento de drogas se transforma em um banho de sangue, Macbeth e sua equipe são encarregados de limpar a bagunça. Sua recompensa: poder, dinheiro, respeito. Infectado pela cobiça, culpa, tomado por alucinações e influenciado por sua amada Lady, Macbeth embarca em uma jornada sem volta de sangre e traição. (Resenha: Macbeth – Jo Nesbø)

Opinião: A obra de Jo Nesbø faz parte de um projeto da Editora Hogart Press (fundada por Virgínia e Leonard Woolf) em que peças de Shakespeare foram revisitadas por grandes escritores ao redor do mundo. Ao norueguês coube a tragédia de poder, ambição, traições e vinganças de Macbeth. E rendeu um livro denso, viciante e pra lá de genial em sua concepção.

Aos que não estão familiarizados com a peça de Shakespeare, Macbeth trata, em linhas bem gerais do seguinte: Macbeth é um general do exército escocês, a serviço do Rei Duncan. Um dia, após uma batalha, Macbeth, acompanhado de outro general, Banquo, encontra três bruxas, que profetizam que ele está destinado a ser rei, assim como os filhos de Banquo. A cobiça pelo poder mexe com o protagonista, mas ele sabe que a única forma de subir ao trono seria assassinando Duncan. Macbeth hesita, pelo menos até contar o ocorrido à esposa, a ardilosa Lady Macbeth. Com palavras venenosas e persuasivas, ela convence o marido a agir, e, ele mata Duncan a facadas enquanto o rei dormia (detalhe: o soberano era seu primo e estava hospedado em sua casa). Macbeth e a esposa conseguem incriminar os guardas de Duncan, e o assassino se torna rei. A partir de então, Macbeth passa a ver antigos aliados, como Banquo e o filho deste, Fleance, como ameaças, e entra numa espiral de loucura e violência que trará consequências trágicas para o seu reinado (resumo retirado de Valeu, Gutenberg).

Mestre do thriller policial, Jo Nesbø trouxe a tragédia shakespeariana para uma cidade caótica, uma terra em que as leis se moldam ao bel prazer de quem tem mais poder, ou juíxo para sempre se manter do lado certo. Ali, há dois líderes poderosos que comandam o mercado das drogas. Eles subjugam a cidade e possuem todas as autoridades a seus pés, incluindo uma polícia corrupta chefiada por um comissário que joga o jogo do poder e “governa” com mãos de ferro dentro do que o interessa.

Quando a balança ameaça pender para um novo lado, mediante um novo comissário idealista e disposto a colocar a honestidade como condutora de suas ações, uma tensão fica palpável no ar. É possível corrigir tantos anos acumulados de corrupção, desvios, falta de ética?

No centro dessa história, o protagonista, Macbeth, é o policial que vai ascender de posto rapidamente, ter atitudes aparentemente corretas e ser facilmente tragado pela sede da ambição desmedida. Até onde ele poderá chegar?

A partir da ideia geral de Shakespeare, Jo Nesbø construiu uma história que tem o seu estilo. Traços de construção de personagens que observamos em O Filho ou mesmo na série de Harry Hole são facilmente identificáveis aqui. E a isso se somou um suspense que é bem sustentado até as páginas finais, porque há personagens dúbios e não sabemos exatamente quem é traidor e quem é digno de confiança nessa trama.

E não há mocinhos nessa história e tampouco as raras atitudes mais heroicas podem ser consideradas como sintomas de decência ou bons modos. Há vício demais entranhado na sociedade criada por Nesbø e mesmo aqueles que tentam escapar, acabam sucumbindo de alguma forma à chantagem, às ameaças contra familiares ou, simplesmente, à tentação do poder.

A violência excessiva que castiga a cidade produz uma sequência de cenas em que mortes se sucedem numa espiral de traições e vinganças sem fim. Tudo vai se escalonando à medida que a ameaça aos donos do poder se fortalece. Isso reunido numa história que reúne produção e distribuição de drogas, cassinos, corrupção policial e cenas de violência explícita e pesada.

Importante destacar a profundidade das reflexões feitas ao longo do livro. Os homens que corrompem e são corrompidos em Macbeth se indagam a todo momento a real necessidade de tais atos, o que os motiva, o que realmente ganham com isso. Há perturbação na consciência desses personagens e Nesbø nos leva por passagens interessantíssimas nesse sentido.

“Talvez sejamos apenas frases esparsas em um eterno balbucio caótico no qual todos falam e ninguém escuta e nosso pior pressentimento se revele afinal como comprovado: você está sozinho. Totalmente sozinho.”

Nota à parte, Lady é uma personagem minimamente pensada para roubar a cena e protagonizar algumas das melhores passagens do livro. Ela confere o toque de genialidade para as ações de Macbeth ao mesmo tempo em que se move por uma ambição pessoal construída em cima de tragédias do passado. Sucumbe, por fim, à sedução da droga e ao trauma relacionado à sua filha.

Jo Nesbø entrega aos leitores e fãs um Macbeth impossível de largar. Somos tragados pela história e ficamos presos ao destino de uma cidade governada pela ambição e pelo crime. Do drama ao thriller policial, o livro contém todos os elementos básicos de uma trama de qualidade com a marca do autor.

Para além disso, a tragédia de Shakespeare ganhou uma roupagem moderníssima e se encaixa como uma luva no cenário psicodélico dessa espécie de Gotham City que a mente de Jo Nesbø criou. Uma cidade sem heróis e onde os vilões se escondem por toda parte.

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O Filho

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Baratas (Harry Hole #2)

O Morcego (Harry Hole #1)

O Autor: Jo Nesbø escritor e músico norueguês premiado pelo Edgar Award. Formou-se na Escola Norueguesa de Economia e Administração de Empresas com uma licenciatura em Economia. Nesbø é célebre sobretudo por seus romances de crime sobre o detetive Harry Hole, mas ele é também o principal vocalista e compositor da banda de rock norueguês Di Derre. Seus livros venderam mais de um milhão e meio de cópias na Noruega e sua obra foi traduzida para mais de quarenta línguas.

Em 2009, foi agraciado pelo prêmio de reconhecimento pelo público da revista Dagbladet ao ter três de seus livros estado no topo da lista de livros mais vendidos na Noruega. Ele também escreveu uma série de livros infantis sob o título Doktor Proktors prompepulver.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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