Sinopse Verus: Um retrato vívido e irresistível da luta de uma mulher em busca de realização pessoal e profissional em uma sociedade que oscila entre a tradição e a modernidade. A pintora de henna abre ao leitor a porta para um mundo – a Índia pós-independência – que é ao mesmo tempo exuberante e encantador, duro e cruel. (Resenha: A Pintora de Henna – Alka Joshi)

Opinião: Dono de uma rica cultura, tradições milenares, uma religião muito forte, um passado colonial e um sistema de divisão social bastante detalhado e de difícil assimilação para nós, a Índia se descortina como um país tão fascinante quanto complexo. Ele guarda muitas semelhanças com o Brasil e é sempre um prazer quando temos oportunidade de mergulhar numa cultura dessas e esbarrar nessas similaridades. Como também é muito bacana a experiência de adentrar esse mundo pelas mãos de uma narrativa vibrante, delicada e que contempla ao máximo possível as nuances e contradições de uma sociedade em transformação.

Situado na metade final dos anos 1950, um período ainda recente da independência indiana do Império Britânico, A Pintora de Henna é um convite aos leitores para desvendar a Índia em pleno processo de construção enquanto país livre que vai se autogovernar. Ao mesmo tempo em que apresenta a saga de vida de uma mulher em busca de construir algo seu, enfrentando obstáculos e dificuldades inerentes ao fato de ser mulher, não ter posses e pertencer a uma casta diferente daquela em que sua profissão normalmente se encaixa. Ao seu lado apenas a obstinação de que consegue chegar lá.

Lakshmi, a protagonista que vai nos contar sua história, tem 30 anos e trabalha como artista de henna, atendendo as mulheres mais ricas e importantes da cidade de Jaipur, palco dessa trama. Ela está nessa cidade e fazendo esse trabalho após fugir do marido, que a tratava com violência. Essa fuga trouxe decepção e manchou a imagem de seus pais. Lembrem-se de que na Índia a reputação e a honra de uma família são questões muito sérias. É tudo valorizado. Além disso, ela também ajuda essas senhoras com produtos naturais fabricados a partir de ervas. Ela fornece chás, cremes para mãos e cabelos e tônicos e remédios que podem ajudar a interromper uma gravidez indesejada.

A vida de Lakshmi está em franca ascensão. Ela inclusive está conseguindo construir sua própria casa, do seu jeito e com todos os detalhes e luxos que vê nas imensas mansões que frequenta. Mas tudo muda drasticamente quando bate à sua porta o marido abandonado, Hari, trazendo consigo a pequena Radha, uma adolescente de treze anos de idade e irmã que Lakshmi não fazia a menor ideia que tinha. Os pais faleceram e Radha não tem ninguém mais no mundo. E assim, nossa protagonista se vê às voltas com uma agenda lotada de clientes, seus projetos de ascender socialmente a pleno vapor e uma irmã que não conhece absolutamente nada das tradições e inúmeros detalhes dessa sociedade.

A Pintora de Henna é um livro quase poético. Porque a cultura indiana é apresentada nos mínimos detalhes em cenas e passagens que parecem uma pintura. É uma história de cores, de vibração, em que sentimos os personagens, suas emoções, seus dramas e também toda a alegria, a música, a dança. Só por isso, a leitura já é fascinante. A autora, indiana, conhece muito bem tudo aquilo que está descrevendo e soube nos transportar facilmente para casas e palácios, para ruelas e situações de pobreza e inserir as expressões e costumes de um jeito bacana de lermos. Atente-se aí que a tradução de Cecilia Camargo Bartalotti contribui magistralmente para isso.

Por outro lado, A Pintora de Henna mergulha em duas histórias de vida bem distintas e bem próximas. Depois que entendemos muito bem as motivações e todo o plano de vida de Lakshmi, simpatizamos com sua rebeldia ao largar o marido numa sociedade ainda muito patriarcal e buscar construir a sua vida do seu jeito. Só que para ter esse crescimento, quando chega a Jaipur, ela precisa recuar um pouco e se adaptar a um modelo de vida em que ela vai servir mulheres riquíssimas e conquistar a confiança para abrir mais o mercado, ter mais clientes. Ser confiável é algo muito valioso nessa sociedade. Estamos lidando com muitas tradições e com famílias poderosas. Então, ela precisa ter essas mulheres como aliadas. Embora jamais essas pessoas serão suas amigas.

A outra história de vida é a de Radha, a adolescente também bastante rebelde como a irmã mais velha, só que inexperiente para esse monte de regras e cuidados. Radha representa uma nova geração disposta a não aceitar tudo só porque “sempre foi assim”. Então ela questiona, se rebela, não cumpre muitas coisas e acaba complicando a vida de Lakshmi. Mas aí a força do sentimento familiar sempre vai falar mais alto. Isso é muito valioso na Índia.

O livro vai acompanhar um período de intensas transformações na vida dessas duas personagens. Vamos entender mais dos costumes do país, vamos ver muito dessas várias questões que eu chamei a atenção como sendo valiosas para a sociedade indiana e vamos perceber que a força de vontade consegue superar os mais complicados problemas. É uma história de superação e de busca de um lugar. Tudo isso alinhavado pela magia da pintura de henna que tem significados muito especiais. É uma arte extremamente importante.

Ler A Pintora de Henna é passear por uma outra cultura e tentar nos aproximar das histórias de vida ali apresentadas. Entendermos uma sociedade e como, nesse recorte temporal apresentado no livro, ela estava se desenvolvendo e pensando o seu futuro. O livro traz emoção e aprendizado. Mostra dor e beleza. E permanece um bom tempo em nossa mente.

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Observação: este livro foi lido na edição da TAG Inéditos de Janeiro de 2022

A Autora: Alka Joshi nasceu em Jodhpur, na Índia, e vive nos Estados Unidos desde os nove anos. Fez a graduação na Universidade de Stanford e o mestrado no California College of the Arts. Dirigiu a própria agência de publicidade e relações públicas por trinta anos. A pintora de henna é seu primeiro romance.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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