Sinopse Todavia: Num bairro pobre da ilha caribenha de Trinidad e Tobago, Clyde tenta construir um futuro para sua família. Ele é pai dos gêmeos Peter e Paul. Geneticamente, eles são idênticos. Em caráter e comportamento, porém, são completamente diferentes. Peter é o filho prendado. Desde pequeno, se destacou pela inteligência e pelas notas altas. Seu pai espera que ele ganhe um prêmio que lhe permitirá estudar nos Estados Unidos. Já Paul é um garoto cheio de limitações. Aos treze anos, perambula pelas ruas em meio a devaneios e quer distância dos livros. Seu sonho é arrumar um emprego, viver de jeans e óculos escuros, e dar o restante do dinheiro para a mãe. Até que uma noite Paul desaparece. E Clyde sai pela ilha em busca de seu garoto problema. Mas qual exatamente é seu problema? Menino de ouro é um livro raro, capaz de fazer um mergulho vertical e delicado nos dilemas de uma família pobre e embrutecida, e ao mesmo tempo manter o leitor grudado em cada página, como num thriller dos mais eletrizantes. No fim das contas, qual dos dois era o menino de ouro? (Resenha: Menino de Ouro – Claire Adam)

Opinião: Com um ritmo de narrativa que em alguns momentos ganha contornos de thriller, Menino de Ouro é uma história profunda, reflexiva e tocante sobre os desafios de uma família, em especial de um pai, na criação de gêmeos extremamente diferentes em uma Trinidad e Tobago arisca e cruel com os menos favorecidos. A obra de Claire Adam é um retrato duro de dilemas familiares em que o sonho de um futuro melhor esbarra nos caprichos de uma realidade implacável que se estende, até mesmo, às relações entre parentes.

Menino de Ouro gira em torno do sumiço de Paul, um garoto de treze anos limitado devido a um problema de falta de oxigênio logo ao nascer. Seu prejuízo intelectual é encarado como um retardo mental pelo pai, que não faz questão de esconder a falta de esperanças com ele e a preferência por seu irmão gêmeo, Peter. Aliás, o pai sempre faz pairar sobre Paul a ameaça de mandá-lo para um hospício. Em outra ponta da história, com menos foco a não ser em pequenas passagens, a mãe, Joy, faz questão absoluta que os filhos estejam sempre juntos na escola ou em qualquer outra atividade. O brilhantismo intelectual de Peter, acha ela, pode ajudar de alguma forma Paul. Com isso, às vezes, o desenvolvimento de um esbarra na necessidade de estar ao lado do outro.

A busca de Clyde, o pai, pelo filho desaparecido vai ser costurada por capítulos que voltam ao passado para explicar aos leitores a realidade que essa família vive. Alternando a voz do pai com a de Paul, o livro nos leva para um passeio por Trinidad e Tobago, um país distante do nosso conhecimento geral, mas que guarda algumas leves semelhanças com o Brasil pobre da favela ou da periferia. Há violência, ganância, corrupção, abusos, assassinatos e uma série de dramas que vão contornando a trama central para nos situar na dificuldade de construir um futuro em meio a tantos desafios, não só o financeiro.

Embora exponha muito da violência de um país, o ponto principal que podemos observar em Menino de Ouro é o drama familiar. Há aqui, um pai que carrega o peso de ser o homem da casa, o responsável por tomar as decisões, por planejar o futuro, por prover financeiramente a todos. Clyde é um personagem ricamente construído em seu orgulho pessoal, suas crenças – e a falta delas, seu senso de dever para com a família e a honestidade para com a sociedade. Um homem moldado por tudo que o cerca e que quando se vê frente à tomada de uma decisão importante acaba se tornando vítima desse sistema, inclusive dentro da própria família.

“… a verdade, no fim das contas, é que qualquer um – amigos, família, qualquer um – pode traí-lo a qualquer momento…”

A narrativa de Menino de Ouro é lenta, mesmo tendo diversos momentos que a fazem parecer um suspense. A construção de tudo é muito detalhada em uma ambientação muito rica, fruto da experiência de uma autora que viveu no país até seus 18 anos de idade. É sufocante e às vezes nos sentimos de mãos tão atadas quanto Clyde ao perceber que é difícil superar desafios quando tudo o mais parece estar contra nós.

A morte de um tio, um assalto na casa da família que coloca a mãe, Joy, na mira de um revólver, a educação dos meninos em uma escola e a tentativa de um padre de mostrar que Paul não tem retardo mental, um sequestro com um pedido de resgate motivado por pura e simples ganância… São muitas as variáveis em jogo na vida dessa família que são suficientes para fazer desistir. São muitas as guerras a serem travadas. Assim, nos pegamos nutrindo uma imensa simpatia por Paul e lutando contra os sentimentos de compreensão mesclada com raiva pelo comportamento de Clyde. O desfecho de Menino de Ouro não é um conto de fadas. É real, triste e duro como tudo na vida. É o fim de uma história e em certo aspecto o começo de outra. Como tudo na vida…

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A Autora: Claire Adam nasceu em Trinidad e Tobago e vive em Londres. Menino de ouro foi sucesso de crítica e, em 2019, integrou a lista da BBC dos cem livros que “moldaram nosso mundo”.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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