Sinopse Faro Editorial: Durante a cruel época escravocrata do Brasil Colônia, histórias aterrorizantes baseadas em crenças africanas e portuguesas deram origem a algumas das lendas mais populares de nosso folclore. Com o passar dos séculos, o horror de mitos assustadores foi sendo substituído por versões mais brandas. Em “O Escravo de Capela”, uma de nossas fábulas foi recriada desde a origem. Partindo de registros históricos para reconstruir sua mitologia de forma adulta, o autor criou uma narrativa tenebrosa de vingança com elementos mais reais e perversos. Aqui, o capuz avermelhado, sua marca mais conhecida, é deixado de lado para que o rosto de um escravo-cadáver seja encoberto pelo sudário ensanguentado de sua morte. Uma obra para reencontrar o medo perdido da lenda original e ver ressurgir um mito nacional de forma mais assustadora, em uma trama mórbida repleta de surpresas e reviravoltas. (Resenha: O Escravo de Capela – Marcos DeBrito)

Opinião: As lendas e mitos folclóricos brasileiros com suas origens indígenas, africanas, europeias ou uma mescla de tudo isso constituem uma riqueza única. Quem já se aventurou pelas páginas de Câmara Cascudo e seu compêndio de lendas nacionais pode atestar o quanto temos de material cultural valioso tão pouco explorado. Infelizmente, os tempos modernos têm legado muito disso ao esquecimento. O Escravo de Capela surge, então, como uma obra ímpar. Munido de uma boa pesquisa e muita criatividade, o catarinense Marcos DeBrito provou que é possível, sim, escrever terror de qualidade com DNA brasileiro, sem precisar recorrer a enredos americanizados mal desenvolvidos.

Passado no período colonial-escravocrata, O Escravo de Capela já tem somente nisso material de sobra para desenvolver o horror. Afinal, os anos em que a escravidão reinou em nosso Brasil Império já constituem suficiente carga de violência que não deixam a dever a nenhuma ficção. Neste ponto, a história traz uma de suas maiores qualidades: a perfeita reconstituição de época. O ambiente de uma fazenda com os donos, escravos, criadas e feitores é caracterizado nos mínimos detalhes. Marcos nos insere nesse mundo com uma linguagem tão envolvente que em muitos momentos me remeteu aos nossos melhores escritores regionalistas como Raquel de Queiroz, Zé Lins do Rêgo ou mesmo Jorge Amado. As cenas e diálogos são precisos, sem excessos, na medida certa para passar sua mensagem.

A partir daí duas histórias se desenvolvem. Em um ponto, a família Cunha Vasconcelos com seus segredos, típicos do período, e seu jeito sanguinário no tratar dos escravos; no outro, o recém-chegado escravo Sabola Citiwala e sua resistência aos grilhões. Essas duas histórias vão se juntar para produzir a segunda grande qualidade da obra: o terror criado com base no folclore brasileiro. Aqui temos Marcos DeBrito desfiando uma qualidade imaginativa que não deixa nada a dever aos cultuados autores de terror mundial. Sem precisar recorrer a nada “estranho” à nossa cultura, o autor faz excelente uso de lendas dos nossos tempos de criança para “tocar o terror” na Fazenda Capela e gelar os ossos de personagens e leitores.

Recheado de sequências tensas, reviravoltas surpreendentes e um desfecho inimaginável, O Escravo de Capela certamente está entre o que de melhor se produziu em terror na literatura brasileira. Da brutalidade real da escravidão ao horror de uma vingança perpetrada por um ente ressurgido dos mortos, este é um livro para ser devorado e indicado sem receios. E Marcos DeBrito é um nome para ser anotado na lista de leituras imperdíveis.

Avaliação: 4 Estrelas

O Autor: Marcos DeBrito nasceu em Florianópolis e mudou-se para São Paulo em 1998 para estudar cinema. Formado pela FAAP, é diretor e roteirista. Seu curta-metragem Vídeo sobre tela, de 2001, ganhou o prêmio especial do júri no Festival de Gramado. À sombra da lua é seu primeiro romance.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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