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Resenha: A Barata – Ian McEwan

Sinopse Companhia das Letras: A frase de abertura de A barata, o novo livro de Ian McEwan, é um evidente tributo à mais famosa obra de Franz Kafka, A metamorfose. Por meio dessa divertida inversão, McEwan cria a trama desta deliciosa sátira política. Nela, Jim Sams é um inseto que, do dia para a noite, assume a forma humana de primeiro-ministro da Grã-Bretanha. Sua missão é realizar a vontade do povo, expressa na aprovação da Lei do Reversalismo, que pretende remodelar o funcionamento da economia. Trata-se, é claro, de uma engenhosa metáfora para o Brexit. Mas nada poderá deter o primeiro-ministro: nem a oposição, nem os dissidentes de seu próprio partido, nem mesmo as regras da democracia parlamentar. (Resenha: A Barata – Ian McEwan)

Opinião: Ainda vai levar uns bons anos e o necessário distanciamento histórico-temporal para que pesquisadores, economistas, sociólogos e pensadores em geral entendam todo o movimento e os humores sociais que levaram ao Brexit, na Grã-Bretanha. A ruptura com a União Europeia causada por um misto de nacionalismo exacerbado, preconceito, manipulação de informações e uma visão mais conservadora do mundo ecoa em maior ou menor grau em diversos outros países, e ainda tateamos em busca de uma explicação para o que está levando à essa transformação.

Se no mundo real, contudo, é preciso esse intervalo de tempo para avaliar causas e conferir as consequências, na ficção pode-se investigar com mais liberdade e teorizar sobre essa brusca mudança de rumos. E uma ótima distração, com ácida crítica, pode ser encontrada em A Barata, uma metáfora genial escrita por quem entende bem do povo britânico.

“Naquela manhã, Jim Sams, inteligente, mas de forma algum profundo, acordou de um sonho inquieto e se viu transformado numa criatura gigantesca.”

Invertendo a lógica Kafkiana de A Metamorfose, Ian McEwan faz uma barata tomar o lugar do primeiro-ministro inglês para, junto à outras de sua espécie, colocar em prática um plano para mudar os rumos da economia: as pessoas a partir de agora precisam pagar para trabalhar e ganharão dinheiro consumindo. Será o fim das reservas financeiras. Ninguém poderá mais acumular dinheiro. Essa ideia revolucionária vai ser posta em prática a despeito do resto do mundo operar em sistema diferente, mas o que importa? Eles que se adequem. Ah, e ainda existe um ocupante na Casa Branca, Tupper, que pode ser conquistado para a causa. Assim, A Barata vai satirizando em ações, gestos e comentários, um pouco de como o impensável pode se tornar realidade a partir de poucos atores a brincar com os humores da sociedade.

A Barata é um conto com ares de ensaio perfeito para, utilizando-se do manto da ficção, nos mostrar as visões que o consagrado prosador britânico tem de seu país e de como ele chegou a esse momento. Os interessados em política e que acompanham mais de perto o movimento das peças no xadrez internacional certamente vão apreciar melhor os humores e sarcasmos que envolvem o dia a dia político. Porque o jogo de bastidor e os acordos em off estão ali, somados com o comportamento da imprensa, o uso do Twitter e a conclusão óbvia de que um grande ponto de interrogação paira no ar.

Mais interessante que o conto A Barata em si, chama a atenção o posfácio da obra, em que McEwan discorre sobre tudo que vem acontecendo no mundo, principalmente em EUA, Grã-Bretanha, Brasil, com o avanço do populismo de direita. Publicado em 2019, A Barata não poderia imaginar que um ano depois o mundo seria assolado por uma pandemia em que esses mesmos líderes populistas liderariam uma corrida contra a vida e em favor de seus egos com a desculpa de salvar a economia. No fundo, talvez, estejamos mesmo à mercê de baratas, quem sabe ratazanas, a brincar com o jeito de governar em busca de poder. Autoritário. Autocrata. Ilimitado.

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Lições

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O Autor: Ian McEwan é considerado um dos grandes nomes da ficção britânica contemporânea. Seu primeiro livro, First love, last rites (1975), ganhou o prêmio Somerset Maugham. É conhecido pela inventividade com as palavras e pelo gosto de usar a mecânica dos thrillers como crítica social. Ao longo de sua carreira foi indicado diversas vezes para receber o Booker Prize, o mais prestigiado prêmio literário britânico, o que veio ocorrer em 1998 com o livro Amsterdam (1998).

Sua obra é famosa pelo realismo psicológico, com rigor de detalhes e clima ameaçador, explorando com frequência temas complexos como escolha ética, decisões difíceis e circunstâncias extraordinárias.

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