Sinopse Companhia das Letras: Victoria Bravo tinha quatro anos quando um homem invadiu sua casa e matou sua família a facadas, pichando seus rostos com tinta preta. Única sobrevivente, ela agora é uma jovem solitária e tímida, com pesadelos frequentes e sérias dificuldades para se relacionar. Mas o passado bate à sua porta, e ela não sabe mais em quem pode confiar. Obrigada a enfrentar sua própria tragédia, Victoria embarca em uma jornada de amadurecimento e descoberta que a levará a zonas obscuras, mas também revelará as possibilidades do amor. Um psiquiatra, um amigo feito pela internet e um possível namorado — qual dos três homens está usando tudo o que sabe para aterrorizar a vida de Vic? E o que afinal ele quer com ela? (Resenha: Uma Mulher no Escuro – Raphael Montes)

Opinião: Como superar um trauma e uma tragédia violenta de infância quando isso, às vezes, depende de se confiar no outro? Desenvolver relações com outras pessoas de forma a se criar um elo que gere confiança é algo difícil para qualquer um de nós “normais”. Imagine então esse grau de dificuldade quando toda a sua família foi brutalmente assassinada na frente dos seus inocentes olhos de quatro anos de idade. O seu humano que emerge daí é alguém um tanto arisco propenso a viver a sua individualidade ao máximo. E se por um desses acasos do destino, um dia, o fantasma do passado bater à sua porta, não é preciso nada mais para o interruptor da paranoia se acender. Não há tratamento psicológico que resista à combinação de trauma + insegurança + medo.

Extremamente bem explorada em dezenas de thrillers psicológicos mundo a fora, a situação em questão ganhou contornos bem brasileiros em Uma Mulher no Escuro, uma interessante incursão de Raphael Montes pelo suspense após uma trajetória consagradora pelo terror. Os principais ingredientes de uma boa história de mistério e ação estão todos presentes no livro, o que pode ser classificado depreciativamente por alguns como uma sequência de clichês. Só que quando esses tais clichês são bem colocados e funcionam a serviço de uma trama com início, meio e fim bem definidos, um mistério amarradinho e personagens minuciosamente construídos, não há crítica negativa que se sustente. Temos, enfim, um suspense de qualidade para chamarmos de “brasileiro”.

A tragédia familiar sofrida por Victoria Bravo serve de base para a construção de uma personagem feminina poderosa e convincente em todos os seus medos e atitudes. Essa é a maior qualidade de Uma Mulher no Escuro. Nenhum grande suspense resiste somente de mistérios e reviravoltas se nele não tivermos grandes protagonistas. Construir uma vida a partir de retalhos e enfrentar “o mundo lá fora” não é tarefa fácil, relacionar-se com os outros é mais difícil ainda, e superar a ameaça de que o passado ainda está no presente faz tudo se tornar um pesadelo. Essa loucura foi explorada com maestria e veracidade por Raphael, fazendo com que os leitores se sintam próximos de Victoria e de sua situação. A protagonista é grande personagem no universo de obras do autor.

Cumprida a missão de ter uma boa trama humana em mãos, Uma Mulher no Escuro brincou com as possibilidades do suspense colocando três personagens a serviço de um mistério muito bem amarrado. Orbitando ao redor de Victoria, três homens cada qual encantador ao seu modo. Quem é quem nessa história? Para descobrir isso, temos uma prosa vigorosa e com ritmo alucinante. Os capítulos se sucedem de forma vertiginosa e o livro, de pouco mais de duzentas e cinquenta páginas, acaba sendo devorado em questão de horas (gastei dois apenas e isso porque a rotina me impediu de devorá-lo mais rapidamente). O mistério principal guarde em si inúmeros desdobramentos com segredos que trazem novos segredos.

Ambientado no Rio de Janeiro, da Ilha do Governador a Copacabana, Uma Mulher no Escuro tem um tempero brasileiro que dá caldo para a trama. Acostumados a ler essas histórias sob a ótica de cidadezinhas encravadas em estados norte-americanos, Raphael conseguiu a proeza, que muitos outros autores não conseguiram, de não nos fazer torcer nossos narizes para algo assim narrado bem no quintal de casa. Em outras palavras, a história convence e seus desdobramentos tiram o fôlego na medida exata. Incluindo aí um desfecho preciso, com sequência de reviravoltas que não deixa pontas soltas.

Dificilmente encontraremos uma produção nacional que reúna tantas qualidades de suspense quanto Uma Mulher no Escuro. E, reforço, um suspense com DNA bem brasileiro. Axé!

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O Autor: Raphael Montes nasceu no Rio de Janeiro em 22 de setembro de 1990. Advogado e escritor, teve contos publicados em diversas antologias de mistério, inclusive na Playboy, na antologia “Rio Noir” e na prestigiada revista americana Ellery Queen’s Mystery Magazine. Aos 20 anos, impressionou a crítica e público com Suicidas, um suspense policial finalista do Prêmio Benvirá de Literatura 2010, do Prêmio Machado de Assis 2012 da Biblioteca Nacional e do prestigiado Prêmio São Paulo de Literatura 2013.

Todos os seus livros tiveram os direitos de adaptação vendidos para o cinema e estão em produção. Entre abril/2015 e fevereiro/2018, Raphael assinou uma coluna semanal em O Globo. Atualmente, o escritor apresenta o “Trilha de Letras”, um programa semanal sobre literatura na TV Brasil. Além disso, escreve roteiros para cinema e TV.

 

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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