Sinopse DarkSide: Noemí Taboada é uma jovem independente e chique que mora na fervilhante Cidade do México. Entre as manhãs de estudo na faculdade e as noites glamourosas de festas e bailes, ela gosta de passear em seu carro conversível, ouvir música e sonhar com um futuro onde as mulheres possam fazer suas próprias escolhas ― e viver grandes aventuras. A rotina de Noemí muda drasticamente quando seu pai recebe uma carta de sua prima Catalina, recém-casada com um inglês. A carta é, na verdade, um pedido desesperado de socorro, pois Catalina acredita que corre perigo em High Place, a mansão isolada onde vive confinada com o marido e a família dele. Convocada a investigar o mistério na cidadezinha de El Triunfo, Noemí parte com seu batom vermelho, seus melhores looks e uma dose extra de coragem. Mas nem mesmo nossa intrépida heroína estava preparada para os horrores que a esperavam em uma mansão assombrada por um mal abominável. (Resenha: Gótico Mexicano – Silvia Moreno-Garcia)

Opinião: Uma força do mal que estende seus domínios através de uma decrépita mansão. Mortes violentas, estranhas alucinações e uma família com mais segredos do que é possível guardar. E cogumelos. Muitos cogumelos. É assim que retorno a falar sobre casas assombradas, um dos temas mais recorrentes e envolventes da literatura de terror. Dessa vez desembarcando não nas charnecas e vilarejos ingleses, mas no México e em um local ermo, bem afastado da civilização e vivendo sob a sombra de High Place, nossa mansão tenebrosa.

O ritmo de suspense domina praticamente todos os capítulos de Gótico Mexicano, obra finalista do Bram Stoker Awards 2020 e vencedor como melhor livro de terror no Goodreads Choice Awards 2020. Mas é um ritmo mais lento em que a história vai se desenvolvendo de forma a envolver os leitores. Sem atropelos e de um jeito que facilmente vai irritar aqueles que gostam de muita ação e carnificina. O que predomina aqui é o jeitão da literatura gótica, imortalizada em obras como Frankenstein, Drácula ou O Morro dos Ventos Uivantes.

Em Gótico Mexicano, seguimos a jovem Noemí na busca por salvar sua prima Catalina de uma estranha doença. Após se casar, Catalina foi viver na mansão do marido, High Place. Lá, foi acometida de alucinações, fraqueza e descobriu coisas que abalaram sua mente. As cartas que escrevia para a família não faziam muito mais sentido e, isolada de todos, parecia estar prestes a sucumbir. Noemí, então, embarca para o local e à medida que a história vai avançando, lentamente, como falei, vai descobrindo que High Place esconde segredos terríveis e é dominada por um mal que já consumiu seus habitantes e que tem nela seu próximo alvo.

“Esta casa é podre, decadente, repleta de males e sentimentos cruéis.”

Gótico Mexicano subverte bastante o que estamos acostumados em termos de casas assombras. Talvez já de cara pelo cenário ser o México. E não aquele ao qual estamos acostumados. A parte mexicana retratada por Silvia Moreno-Garcia é chuvosa, cinzenta, carregada de neblina e triste. É um lado pouco mostrado de um México onde normalmente só vemos explosão de cores e a tradicional festa dos mortos.

O branco, inglês, que domina High Place veio para explorar as minas de prata. Com ele trouxe a força destruidora da colonização. E despertou o mal. Que literalmente devorou seus habitantes, possuindo suas mentes e garantindo a sobrevivência geração após geração. Há um quê de canibalismo e muito de incesto na trama. Mas tudo vai surgindo de modo sutil. Com predominância detalhada das divagações da protagonista Noemí, estranhas visões não-explicadas e um mistério amarrado até as últimas páginas. Justiça seja feita, a sequência final é alucinante e a autora ainda saca da manga túneis subterrâneos, uma quase selva de cogumelos, esqueletos e mais revelações.

Gótico Mexicano é um sopro de criatividade no gênero cá nas terras latino-americanas, mostrando nosso potencial para histórias tradicionalmente dominadas por europeus. Silvia Moreno-Garcia nos apresentou uma nova faceta do México e nos envolveu em uma trama bem amarrada e com os melhores ingredientes para satisfazer o apetite dos leitores. E os horrores que se escondem por trás não só das paredes de High Place, mas principalmente dentro de seus habitantes, são inimagináveis e com bom potencial para chocar e embrulhar o estômago.

“Estava viva de mais de uma maneira; em seu âmago apodrecido jazia o cadáver de uma mulher, com membros retorcidos e cabelo quebradiço. E o corpo abiu a boca, gritando dentro da terra…”.

Pra fechar, que esse texto está começando a ficar grande demais, Gótico Mexicano trabalha com o tema da eugenia, algo que vem ganhando mais atenção da literatura nos últimos anos, principalmente após a ascensão de regimes da extrema-direita em diversos países. No livro, os personagens donos de High Place acreditam muito na pureza da raça e em um processo de seleção e mistura para se aproximar dos “tipos perfeitos de pessoas”. Isso, aliás, está por trás de alguns dos horrores que vocês vão descobrir e serve para gerar um pouquinho de reflexão sobre o quanto ainda precisamos aprender para não cairmos em discursos vazios sobre nacionalismos exacerbados. Eles podem facilmente, no futuro, virarem preconceito, perseguição e até extermínio.

Para uma obra de terror, Gótico Mexicano cumpre bem seu papel de trabalhar tanto o gótico na literatura quanto as casas assombradas que encantam os leitores há séculos. Mas ele vai além e traz temas importantes, espalhados sorrateiramente ao longo da história; e um México novo, encantador e assustador. Com personagens que podem povoar nossos sonhos e causar incômodas alucinações.

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A Autora: Silvia Moreno-Garcia Nascida no México e atualmente morando no Canadá, Silvia Moreno-Garcia tem mestrado em Ciência e Tecnologia pela Universidade da Colúmbia Britânica, compilou diversas antologias e é editora na Innsmouth Free Press. Ela também atua como colunista para o Washington Post e faz críticas literárias para a National Public Radio (npr). Além de Gótico Mexicano, é autora de Gods of Jade and Shadow, Certain Dark Things, Untamed Shore entre vários outros livros.

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Jornalista e aprendiz de serial killer. Assumidamente um bookaholic, é fã do mestre Stephen King e da literatura de horror e terror. Entre os gêneros e autores preferidos estão ficção científica, suspense, romance histórico, John Grisham, Robin Cook, Bernard Cornwell, Isaac Asimov, Philip K. Dick, Saramago, Vargas Llosa, e etc. infinitas…

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