Opinião: Dificilmente você vai se deparar com uma história tão pesada e perturbadora quanto a narrada em Fábrica de Vespas!
Publicado em 1984, sendo o romance de estreia do escocês Iain Banks, ele vem provocando controvérsias entre público e crítica desde então, e faz parte daquele seleto time de obras ignoradas pelas editoras brasileiras. Graças ao deus Caveirinha, a DarkSide nos presenteou com uma belíssima edição, lançada em 2016.
A narrativa em primeira pessoa traz o ponto de vista de Frank, o protagonista, que mescla relatos de seus feitos no passado com situações do presente. O lar onde a história se passa é surreal e os personagens são igualmente estranhos e perturbados. Logo no primeiro capítulo já percebemos o ambiente insano que vai nos tragar à medida que os feitos e opiniões de Frank forem sendo expostos.
Frank é um adolescente de 16 anos abandonado pela mãe. Ele vive com o pai na ilha, uma parte afastada da cidade, cercada por montanhas e pelo mar. Este é o seu território. É a área em que ele reina em meio a rituais com crânios de pequenos animais e sacrifícios meio macabros, meio inocentes. Seu pai é um obsessivo por medir o tamanho de tudo dentro de casa e guarda um segredo dentro de seu escritório, sempre trancado a chave. Seu irmão, preso por ter o hábito de colocar fogo em cães, está foragido e pode aparecer a qualquer momento. Assim, temos um núcleo familiar de personagens estranhos, movidos não sabemos exatamente pelo que.
Iain Banks vai conduzindo sua narrativa com os relatos de Frank sobre seu passado, recheado de assassinatos. Isso mesmo, aos 16 anos de idade ele já tem um número razoável de mortes no currículo, e todas são dissecadas pelo próprio Frank que nos presenteia com descrições minuciosas de como planejou cada uma de modo que ele jamais fosse descoberto. Esse é o seu medo, ser pego. Fora isso, sua frieza é perturbadora. E a forma como ele nos conduz pelos caminhos de algumas mortes causa repulsa.
Frank é um psicopata, e nós mergulhamos em sua mente como nenhum outro livro foi capaz de fazer até hoje. Sua visão de mundo é clara, mesmo ele não frequentando escolas ou tendo contato com outras pessoas. Frank sabe exatamente o que é certo e o que é errado, mas isso não significa que ele tenha uma consciência que o faça refletir sobre as consequências de seus atos. Tudo o que ele fez precisava ser feito. Simples assim. A lucidez com que ele divaga analisando situações, às vezes de forma quase filosófica, impressiona. Além disso, Frank tem sentimentos e emoções que em determinados momentos afloram, mas ele também sente necessidade de praticar certos atos, que para nós são errados. E não há remorsos, angústias ou arrependimentos.
É um livro difícil de largar, pois somos fisgados por uma narração de ótimo ritmo. As poucas partes mais lentas são compensadas por cenas asfixiantes. Na sequência final, o segredo do pai é revelado e ficamos com aquela sensação de quando o carrinho da montanha russa despenca a toda velocidade de uma altura infinita. Desconcertante e perturbador, o encerramento do livro entroniza toda a insanidade da história. E aí é necessário pararmos para curtir nossa vida e mais tarde retornarmos para pensar e digerir tudo que nos foi jogado na cara, sem suavizações, de forma fria e calculista como somente Frank seria capaz de fazer. Já a fábrica de vespas é impossível de ser explicada. Você precisa ler para entende-la.
A literatura tem suas crianças e adolescentes psicóticos. Nenhum deles pode ser comparado a Frank. Ele é único. É um personagem tão complexo que seria injusto classifica-lo somente como um psicopata. Trinta e dois anos depois, os brasileiros finalmente têm a oportunidade de conhece-lo e tirar suas conclusões. Fábrica de Vespas é um livro visceral, perturbador, chocante e insano.
Avaliação: 5 Estrelas
O Autor: Iain Banks (1954-2013) nasceu e viveu na Escócia. Tornou-se amplamente conhecido pela controvérsia causada pelo seu primeiro romance, Fábrica de Vespas, publicado originalmente em 1984. Desde então, foi aclamado tanto pela crítica como pelos seus leitores por dezenas de obras de ficção e ficção científica. Foi considerado um dos Melhores Novos Escritores Britânicos em 1993. O jornal inglês The Times aclamou Iain Banks como “o romancista britânico mais imaginativo de sua geração” e o Guardian considerou-o “o padrão pelo qual o restante da ficção científica é julgado”.
Esse livro tá na minha lista faz um tempão rsrsrs