Sinopse Companhia das Letras: Neste romance de 1951, Thomas Mann reconta a fabulosa epopeia medieval do Papa Gregório, homem que vive a dualidade de ser fruto de um pecado e querer servir a Deus com toda sua alma. Narrado por um monge irlandês, o romance acompanha a vida de Gregor, lançado ao mar num cesto, ainda bebê, por ser o fruto pecaminoso de um casal de irmãos nobres. Ele sobrevive milagrosamente e é criado numa ilha por pescadores e um monge. Já adulto, o destino fará com que ele reencontre a mãe, agora rainha, e repita o pecado do incesto, pois ambos ignoravam seus laços de sangue. Banido de novo, ele buscará o caminho da evolução moral e espiritual, para então encontrar a redenção divina. (Resenha: O Eleito – Thomas Mann)
Opinião: O mito de Édipo é levado ao extremo em uma narrativa fascinante, carregada de simbolismo, ironias e lições morais em O Eleito. Obra não tão conhecida de Thomas Mann, o livro é uma viagem às novelas medievais para contar a saga de um homem pecador que passa por todas as atribulações possíveis para ser redimido aos olhos de Deus e escolhido Papa.
A partir de um monge narrador espirituoso, movido pelo “Espírito da Narrativa”, Thomas Mann nos conduz para a corte do duque Grimaldo, palco inicial de nossa epopeia. Aqui vamos conhecer a primeira parte da tragédia que se abate sobre seus filhos, os gêmeos Víliguis e Sibilla. Criados com todos os cuidados que sua posição social exigia, ambos acabam se apaixonando e consumando o ato no dia da morte do pai. Do amor entre irmãos, nasce um fruto maldito, Gregorius, que é lançado ao mar dentro de um barril. Gregorius será encontrado e criado por um monge, vai crescer, se lançar ao mundo e desposar a mãe, consumando um segundo incesto. A tragédia e o extremo pecado, vai levá-lo à uma vida de isolamento em penitência e jejum até o destino – ou o perdão divino, o tornarem guardião das chaves da Igreja em Roma.
No estilo narrativo envolvente de Thoman Mann, a epopeia de Gregório, de pecador a Papa, nos seduz já nas primeiras linhas. Construído de forma muito similar aos medievais romances de cavalaria, contudo com uma linguagem pra lá de acessível, graças também a uma excelente tradução nesta edição da Companhia das Letas, O Eleito versa sobre pecado, expiação e redenção de forma extrema.
Temos nesta obra todos os elementos imagináveis para compor uma história mítica de fé. Começamos com o pecado sexual entre irmãos, movido por um orgulho excessivo, visto que ambos acreditavam que não havia ninguém que os merecesse a não ser eles mesmos. Do pecado vem a busca pela redenção através da expiação: o bebê é lançado à própria sorte no mar, o pai parte em peregrinação à Terra Santa e a mãe passa a dedicar sua vida aos mais pobres. Feito homem, o fruto do incesto acaba desposando a mãe em uma queda vertiginosa na busca pela salvação da alma. A tentação cai duas vezes no mesmo leito. Gregorius, então, decide se isolar do mundo e entrega seu destino à misericórdia divina sem alimentos e ao relento. A redenção chega através de sinais de Deus que conduzem a vacância do Trono de Pedro e a sinalização de que Gregorius deveria ser o novo Papa.
O mito que envolve um tal Papa Gregório que tenha passado por tudo que o personagem de O Eleito passa não encontra base na realidade. Ao todo a Igreja Católica teve 16 papas de nome Gregório, sendo o mais famoso deles, o primeiro, São Gregório Magno, Doutor da Igreja. Para escrever essa fascinante história, Thomas Mann encontrou inspiração no poema épico medieval de Hartmann von Aue. E construiu um livro fascinante em que virtude e pecado caminham lado a lado. Para encontrar a redenção da alma é preciso necessariamente pecar.
O narrador que ao mesmo tempo que se entrega às desventuras contadas, pede desculpas pela empolgação, afinal sendo monge ele não conhece tudo da vida mundana, traz ares de ironia e humor refinados e fazem a narrativa fluir de forma gostosa, envolvente. O Eleito é o típico livro que encanta, tira aqueles sorrisos de canto de boca, e traz ao seu final uma história de vigor, poder e encanto dignas da melhor literatura.
Aos fãs e conhecedores da obra de Thomas Mann, O Eleito, embora pouco divulgado, é um deleite e merece fazer parte da sua lista de leitura. Para os estreantes, embora tenha sido o penúltimo livro escrito pelo autor, pode ser uma ótima porta de entrada para a obra de um dos maiores escritores do século XX.
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O Autor: Thomas Mann foi um dos grandes escritores alemães, autor de obras-primas como A montanha mágica e Morte em Veneza. Adversário ferrenho do nazismo, deixou a Alemanha em 1933, fixando-se mais tarde nos Estados Unidos, de onde proferiu os discursos reunidos em Discursos contra Hitler.
Além de ser um notável romancista alemão, por meio de seus ensaios Mann tornou-se um porta-voz dos valores e da literatura alemãs, ajudando-os a permanecerem vivos durante uma das épocas mais tenebrosas para a cultura germânica.
Tendo recebido o Nobel de Literatura de 1929, é considerado um dos maiores romancistas do século XX.