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Resenha: Alamut – Vladimir Bartol

Sinopse Morro Branco: Em Alamut, Vladimir Bartol reimagina a história de Hasan ibn Sabbah, conhecido como “o velho da montanha”, que no século XI fundou A Ordem dos Assassinos, uma tropa suicida de elite alimentada por uma intensa paixão religiosa e pela promessa de paraíso que os aguardava. Ambientada na imponente fortaleza de Alamut, situada nas montanhas de Elburz no atual Irã, a narrativa aborda questões como fé, retórica, fanatismo e a real finalidade do poder. Publicada originalmente em 1938, a obra é constantemente utilizada na análise de novos levantes totalitários e também ganhou os holofotes nos eventos de 11 de Setembro. Mas, muito além de uma religião ou regime específicos, o livro se propõe a examinar como ideologias podem ser manipuladas por um líder carismático e transformar crenças individuais em fanatismo. (Resenha: Alamut – Vladimir Bartol)

Opinião: Um líder carismático que se apodera de uma vertente religiosa e molda parte da doutrina de forma a se encaixar naquilo que ele precisa. Uma mensagem bem trabalhada tanto no aprendizado dos jovens quanto na propagação para os fiéis em potencial. Um conjunto de ações que, ao ser colocado integralmente em curso, desencadeia o fanatismo sem limites. Seguidores que perdem rapidamente o poder de contestar e se entregam a qualquer coisa que esse líder orientar. Até onde isso pode chegar?

Alamut é uma obra poderosa que apresenta aos leitores, de forma romanceada, a história de um homem que moldou a fé islâmica criando uma vertente extremamente radical e fanática. Hasan ibn Sabbah fundou a Ordem dos Assassinos, que inspirou o jogo Assassin’s Creed, se formos falar em algo mais atual e popular. Só que mais do que isso, essa Ordem influenciou uma legião de fiéis dispostos a fazer qualquer coisa para chegar ao paraíso. Em nome da religião, essas pessoas matavam, mesmo que para isso fosse preciso morrer junto. Soa atual para vocês?

Pois é, a Ordem dos Assassinos que vocês vão conhecer nesse livro, chega aos dias atuais na forma de atentados terroristas em que homens se explodem, jogam aviões em prédios e matam sem nenhuma preocupação. Pelo contrário, executam isso com felicidade. Sabem por quê? Porque eles têm a certeza de que serão recompensados com o acesso ao paraíso descrito nos textos sagrados. Ao matar e morrer pela fé, eles estão apenas cumprindo os desejos divinos.

Vladimir Bartol mergulhou nessa história, que se passa no século XI, para explicar aos leitores como é possível influenciar mentalidades a ponto das pessoas se autodestruírem. Para isso, Alamut acompanha, numa narrativa de leitura bastante fluida, o passo a passo da construção da doutrina de Hasan, também conhecido como “o velho da montanha”.

Alamut é uma fortaleza considerada impenetrável. Bastante fortificada, situada no alto de um vale, e com dois ambientes bem distintos e sem conexão direta um com o outro, ela é o palco perfeito para se colocar em prática uma experiência filosófica, religiosa e de guerra. Em primeiro plano, há a parte que abriga homens e jovens treinados para a arte da guerra e da matança. No outro, numa área paradisíaca de jardins e gramados, meninas são instruídas para se parecerem ao máximo com habitantes do paraíso descrito no Alcorão. Ah, e no centro de tudo, uma torre onde Hasan habita longe dos olhos de todos e coordena seu plano.

Revezando sua narrativa entre apresentar a formação dos futuros fiéis dessa vertente religiosa e longas explanações de Hassan com seus interlocutores mais próximos, Vladimir Bartol consegue esmiuçar aos leitores como é possível combinar tantos e tão simples elementos de forma a manipular e fanatizar. Não à toa, se guardarmos as devidas diferenças geográfico-temporais, é muito fácil entender como lideranças totalitárias seguem conseguindo ascender ao poder e arrebatando tantos adeptos, mesmo praticando atos abomináveis.

A leitura de Alamut, como a própria abertura do livro deixa claro, precisa ser feita com cuidado para não fazermos associações erradas e preconceituosas contra o Islamismo e os países e fiéis que o seguem. É preciso ler com o entendimento que se trata de um núcleo extremista, comandado por uma única pessoa que claramente não tinha pudores ou crenças religiosas muito fortes. Em tempos dos tribunais das redes sociais todo o cuidado é pouco para não generalizarmos a sairmos apontando o dedo e julgando.

Seja pelo ponto de vista da psicologia, do fervor religioso, do militarismo ou da manipulação política, Alamut é um desses livros únicos e de leitura quase obrigatória. Você pode encarar tudo como uma grande obra de ficção, e o desenrolar da trama agrada e satisfaz, ou você pode entender como fatos narrados em forma de romance, que o livro também cumpre bem o seu papel. O importante aqui é mergulhar nesse estudo que Bartol nos apresenta, entender bem o que é explicado e contado ali e tirar lições que podem ser muito valiosas para compreender melhor acontecimentos que estão por aí em manchetes e noticiários.

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O Autor: Vladimir Bartol nasceu em 1903, na cidade de Trieste, parte do antigo Império Austro-Húngaro antes da ocupação italiana na Segunda Guerra Mundial. De ascendência eslovena, foi um jornalista e intelectual formado na Sorbonne, na França, e um grande seguidor de Jung e Freud. Em Alamut, Bartol entrelaça psicologia e literatura ao recontar a história de um líder totalitarista, aludindo aos regimes fascistas em ascensão à época da publicação. Vladimir dedicou quase uma década à escrita do livro e continuou publicando diversos trabalhos menores, entre contos e peças, mas nunca mais escreveu outro romance. Faleceu em 1967.

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