Sinopse Rocco: Da mesma autora de “As águas vivas não sabem de si”. Alto do Oeste é uma cidade no meio do Cerrado, que, no início desse século, afundou inexplicavelmente dentro de um lago. Apesar de insólita, essa submersão foi acontecendo de forma lenta e gradual, de modo que também foi aos poucos que seus habitantes foram “expulsos” pelo avançar das águas e obrigados a abandonar a cidade. Anos depois, uma seca extrema no cerrado voltou a revelar Alto do Oeste, e todos os resquícios da vida das pessoas daquele lugar antes da inundação vieram à tona novamente, como se fossilizados pelo barro que agora encobre todas as coisas. Ao saber da notícia, Kênia Lopes, uma antiga moradora da cidade, decidiu que precisava fotografar as ruínas, como se em busca da resposta para uma questão jamais respondida: o que faziam os moradores enquanto aquele pequeno apocalipse se aproximava? (Resenha: Cidades Afundam em Dias Normais – Aline Valek)
Opinião: Sabe aquela sensação nostálgica que bate quando você visita um lugar que foi muito importante na sua infância ou que marcou sua vida por algum motivo? Um misto de incômodo e conforto que você não consegue explicar, mas que, de uma forma muito pessoal, te toca profundamente e você não consegue expressar em palavras. É exatamente essa a sensação que a leitura de Cidades afundam em dias normais nos transmite.
Através de capítulos curtos e precisos, Aline Valek nos leva em uma jornada tão realista, que muitas vezes me vi procurando na internet sobre Alto do Oeste e seus habitantes. Os personagens apresentados são desenvolvidos aos poucos, dissecando suas camadas em seu tempo e sem pressa (apesar de o livro ter apenas 256 páginas).
Intercalado com a narrativa atual, quando Alto do Oeste volta das águas e do barro, temos os episódios durante o alagamento da cidade. As origens, as raízes de cada habitante. Somos lançados aos problemas e dores de cada um e aprendemos a gostar de todos à sua maneira. É até complicado entender qual é o plot principal desse livro. Eu mesmo às vezes deixei a leitura de lado por não estar vendo onde aquilo tudo estava me levando. Demorei a entender que o objetivo da autora não era contar a história de uma cidade que afundou e depois emergiu. O objetivo é contar a história de pessoas, a cidade é só um plano de fundo. Só fui perceber isso ao final, nos últimos capítulos, quando terminamos de ler o diário de uma das personagens – que, diga-se de passagem, são as partes mais encantadoras.
Uma das coisas mais impressionantes dessa narrativa é o lado jornalístico. Kênia e seu companheiro de viagem registram tudo o que veem através de entrevistas, fotos e vídeos da cidade. Apesar de não ter um formato de documentário (como Daisy Jones & The Six, por exemplo), Cidades afundam em dias normais tem esse traço documental e muito fotográfico. Você consegue ver a cidade toda em sua cabeça, inclusive as situações contadas pelas pessoas que moram ali. Para Kênia, tudo é ainda mais pessoal. Além de estar registrando um acontecimento histórico, ela cresceu naquele lugar, viveu suas primeiras experiências de vida ali, e retornar a um lugar cheio de memórias e lembranças pode ser difícil do que ela esperava.
Bom, não vou ser hipócrita de dizer que amei 100% do livro. Algumas partes, para mim, foram um pouco arrastadas. Porém, tenho certeza de que isso ocorreu por uma ideia errada que eu tive inicialmente. Essa é uma história difícil de ser digerida, é incômoda pelas situações difíceis que os personagens passam, mas é extremamente real e necessária. A nota final não poderia ser outra… 5 estrelas!
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A autora: Aline Valek é escritora e ilustradora. Nasceu em Minas, é brasiliense, vive em São Paulo, mas mora na internet, onde publica textos. Escreve em seu blog, é autora da newsletter Bobagens Imperdíveis e colunista da Carta Capital. As águas-vivas não sabem de si é seu primeiro romance, mas já lançou de forma independente dois livros de contos: Hipersonia crônica (2013) e Pequenas tiranias (2015).