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Resenha: Dom – Tony Bellotto

Sinopse Companhia das Letras: A história alucinante de Pedro Dom, jovem de classe média que se tornou chefe de uma quadrilha de roubo de residências no Rio de Janeiro dos anos 2000. Para sustentar o vício em cocaína ou simplesmente pela emoção, Pedro Dom passou a roubar. Nascido em 1981 numa família carioca de classe média, aos vinte anos ele já era um assaltante procurado. No romance, Tony Bellotto conta não apenas a trajetória de um jovem fora da lei — desde a adolescência até sua morte em 2005, aos 23 anos, quando foi baleado pela polícia —, mas a história de um país marcado por profundas desigualdades sociais, de uma guerra às drogas que parece infinita, de uma máquina estatal cujos agentes corruptos rivalizam com aqueles que já perderam ou estão prestes a perder as esperanças. À medida que descortina o panorama dramático da vida de Pedro, em especial sua relação com o pai — um agente da polícia aposentado que durante anos trabalhou no combate ao tráfico e fez parte do Esquadrão da Morte na ditadura —, a narrativa de Bellotto alcança um ritmo vertiginoso, de impacto profundo. (Resenha: Dom – Tony Bellotto)

Opinião: Conhecido como “ladrão fashion” pelo seu gosto por roupas e sapatos de gripe e, até sua morte, um dos mais procurados do Rio de Janeiro, Pedro Machado Lomba Neto, ou Pedro Dom, é um desses casos de alguém que tinha tudo para construir uma vida sólida, talvez bem sucedida, mas que optou por trilhar o caminho do crime. Contrariando o senso comum que às vezes teima em julgar as pessoas simplesmente pelo berço em que nascem ou pela educação que recebem, Pedro Dom saiu da classe média e de uma boa criação familiar para os braços da criminalidade. Seriam os roubos e os assaltos uma vocação? Um vício cultivado pela adrenalina? Será que seu destino estava traçado desde sempre e nada mudaria seus rumos?

Morto aos 23 anos de idade, em 2005, em um confronto com a polícia em que até uma granada foi utilizada para facilitar sua fuga, Pedro Dom teve uma trajetória de vida alucinada em que o amor que ele sentia pela família e toda a boa vontade e tentativas de ajuda não foram suficientes para mudar seu comportamento. Usuário de drogas desde os nove anos de idade, Pedro caiu na criminalidade aos doze como uma forma de sustentar seu vício. Filho de um ex-policial e de uma católica fervorosa, ele recebeu da família tudo o que precisava para “ser alguém na vida”. Mas o vício foi mais forte e ele se entregou com vontade.

Essa curta biografia de vida ganhou narrativa de suspense policial nas mãos de Tony Bellotto. Um livro ágil em que cada passo da vida desregrada de Pedro é bem contextualizado pelos acontecimentos que fervilhavam no Brasil e no mundo. Pelas páginas, percorremos o submundo do crime organizado do Rio de Janeiro com seus traficantes, rixas e disputas; a corrupção policial que era facilmente subornada em troca de vista grossa; e uma galeria de personagens do dia a dia que equilibram suas vidas entre a sobrevivência honesta e a necessidade de uma sociedade que cobra seu preço a cada esquina.

A linguagem direta em uma narração objetiva faz de Dom um livro rápido de ser lido, a despeito de suas 340 páginas. Bellotto conseguiu se equilibrar na linha tênue que separa a narrativa de uma vida criminosa de uma possível romantização do crime. As peripécias de Pedro Dom, um jovem descrito como bonito, sedutor e com uma queda por roupas de grife, podia facilmente cair na apologia das vantagens que uma vida desregrada em roubos e assaltos oferece. Mas Bellotto soube dosar o aparente glamour com os dramas familiares e a espiral de problemas que foram se acumulando e destruindo a vida do rapaz até não haver mais caminho de volta.

Dois pontos chamam a atenção em Dom. Em primeiro, o fato de as prisões pelas quais ele passou funcionaram mais como escolas do crime do que como reabilitadoras para Pedro. Pela leitura da obram percebemos que em nenhum momento foi-lhe oferecida a menor possibilidade de recuperação. Ele estava dentro de um sistema em que a lei do mais forte é a que vale. E essa lei passa muito longe de algo comandado pelo Estado. Em segundo, a forte relação de seu pai, alguém cuja vida foi dedicada a combater o crime. A construção de Victor é interessante e as lutas internas entre o senso de pai e o dever com a sociedade são muito bem exploradas. O lado humano se sobressai nas páginas e traz uma identificação: como nós agiríamos em uma situação assim envolvendo um filho?

Em se tratando de uma ficção com bases bem fortes na realidade, Dom é um livro interessante por mostrar o nascimento de um criminoso e como tudo ao seu redor o foi moldando. Aqui não há nenhum dos estereótipos preconceituosos que permeiam o imaginário dos brasileiros. O crime nasceu na classe média, em Copacabana, em um garoto branco, de uma boa família e com uma ótima criação. O vício o levou aos roubos, assaltos e a uma vida sem limites. A corrupção policial se aproveitou disso enquanto era possível. O Estado e a justiça seguiram seu estilo de se fazer presentes sem muita ação responsável. E o resultado vocês podem conferir nas páginas desse excelente livro.

Ficam as perguntas: seriam os roubos e os assaltos uma vocação? Um vício cultivado pela adrenalina? Será que o destino de Pedro Dom estava traçado desde sempre e nada mudaria seus rumos?

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O Autor: Tony Bellotto nasceu em São Paulo, em 1960. É compositor e guitarrista da banda Titãs. Estreou na literatura em 1995 com Bellini e a esfinge, primeiro de uma série de livros policiais com o detetive Remo Bellini como protagonista. Além destes, a Companhia das Letras publicou os seus romances Machu Picchu (2013), No buraco (2010), entre outros.

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