Sinopse Aleph: Aos 32 anos, Charlie trabalha na padaria Donners, ganha 11 dólares por semana e tem 68 de QI. Porém, uma cirurgia revolucionária promete aumentar a sua inteligência, considerada gravemente baixa. O problema? Enxergar o mundo com outros olhos e mente pode trazer sacrifícios para a sua própria realidade. E resta saber se Charlie Gordon está disposto a fazê-los. (Resenha: Flores para Algernon – Daniel Keyes)
Opinião: “Antes tarde do que nunca” é, literalmente, a melhor forma de saudarmos a publicação de Flores para Algernon no Brasil. Lançado nos Estados Unidos em forma de romance em 1966, somente agora em 2018 estamos tendo a oportunidade de ter contato com uma versão em português. Classificado como ficção científica, o livro ultrapassa as fronteiras de gênero literário para se impor como uma grande obra sobre o ser humano, suas características e essência, e sobre o que há de melhor e pior no íntimo de cada um de nós.
Apresentado aos leitores na forma de um diário escrito pelo protagonista, Charlie, Flores para Algernon narra a história de um cara comum, funcionário de uma padaria, que possui uma considerável deficiência intelectual. Charlie tem o QI extremamente baixo e apresenta todas as dificuldades de aprendizado decorrentes disso. E eis que um dia ele tem a possibilidade de reverter tudo isso ao topar participar de um experimento científico capaz de mudar essa realidade. Cabe destacar que a mudança vai sendo apresentada ao longo da narrativa no formato mais interessante possível. Como temos em mãos um diário escrito por Charlie, o começo é recheado de erros seja de escrita das palavras, pontuação, acentuação e construção de frases. À medida que seu intelecto progride e os resultados do experimento começam a ficar evidentes, as frases vão ganhando um estilo mais refinado, o pensamento é melhor elaborado e desaparece qualquer tipo de erro gramatical.
O sonho de Charlie, contudo, é frustrado pelo choque de realidade. Ao ficar inteligente, a ponto de superar os próprios médicos que o atendem, ele começa a perceber o quanto era limitado e como tudo o que o cercava “não era bem assim”. A transformação de Charlie é o ponto que expõe o comportamento humano em relação aos desiguais, principalmente aos inferiores intelectualmente. O cara “mais lento” não era querido pelos amigos porque havia um sentimento fraterno ali. Ele era, na verdade, o motivo de chacota, de diversão. Assim, o livro percorre o processo de transformação da percepção de Charlie sobre o mundo em que vive. Começamos com a sua visão da vida que leva junto aos amigos e patrões e acompanhamos a mudança que se dá quando ele percebe que nada era como acreditava ser. Um pequeno ratinho do laboratório, Algernon, acaba se transformando em sua melhor companhia.
Flores para Algernon é um relato bastante cru de uma realidade bem próxima de qualquer um de nós. O comportamento de desprezo e zombaria pelos inferiores é muito comum e mentiria quem disser que nunca presenciou ou fez parte de algo parecido, principalmente em escolas ou grupos de amigos. Pode-se dizer que Charlie sofria bullying, com a diferença de que ele não tinha a capacidade de perceber e entender isso. Ele era a chacota e acredita que tudo era fruto de uma intensa amizade. Quando se torna extremamente inteligente, todos se afastam. A brincadeira perde a graça.
A evolução de Charlie traz consigo lembranças do passado e, junto a ele, vamos reconstruindo sua biografia e desvendando fatos esquecidos ou reprimidos. Essa visão global e lúcida de sua vida empurra a obra para seus momentos mais dramáticos, aproximando de um final triste, tocante, comovente e reflexivo. É impossível sair ileso dessa leitura. Seja pela condição do personagem e os altos e baixos que acompanhamos, seja pela nossa própria percepção do mundo, de nossos atos e da forma como enxergamos e nos comportamos perante o outro. Flores para Algernon é uma das melhores leituras, e releituras, porque elas serão necessárias, que você pode fazer na sua vida
Avaliação: 5 estrelas
O Autor: Daniel Keyes Professor e escritor norte-americano de Ficção Científica diplomado em Psicologia, Inglês e Literatura pela Universidade do Brooklyn. Ganhador dos Prêmios Hugo e Nebula em 1959 e 1966 pela publicação do conto e, posteriormente, do livro, “Flowers for Algernon”. O ator Cliff Robertson recebeu um Oscar da Academia por sua performance na versão cinematográfica de 1968 (Os dois mundos de Charly). Flores para Algernon foi traduzido em múltiplos idiomas com direito a versão musical em Londres, Washington e na Broadway; foi adaptado para a televisão nos Estados Unidos e Japão e para o teatro na França, Polônia e Japão. Keyes gravou a versão em audio book do livro. O conjunto de suas obras foi titulado na Alemanha com o Kurd Lasswitz para Melhor Autor Estrangeiro (1986) e com o Locus Award em 1998. Nominado para o Prêmio Edgar (Mystery Writers of America) e como Author Emeritus pela Science Fiction and Fantasy Writers of America em 2000. O autor faleceu devido a uma pneumonia, aos 86 anos, em 2014.