Sinopse Seguinte: Um ano depois de Citra e Rowan terem sido escolhidos como aprendizes, os dois acreditam que podem melhorar a Ceifa de maneiras diferentes. Citra pretende inspirar jovens ceifadores ao matar com compaixão e piedade, enquanto Rowan assume uma nova identidade e passa a investigar ceifadores corruptos. Mas talvez as mudanças da Ceifa dependam mais da Nimbo Cúmulo do que deles. Será que a nuvem irá quebrar suas regras e intervir, ou apenas verá seu mundo perfeito desmoronar? (Resenha: A Nuvem – Neal Shusterman)
“Uma espécie não é capaz de crescer se nunca enfrentar as consequências de seus atos”
Opinião: Vencer a morte é um dos desejos mais almejados pelo homem. Não há dúvidas de que ao longo dos séculos a busca por algo que pudesse driblar as falhas do corpo e permitir uma vida eterna, ou prologada ao máximo possível, motivou diferentes grupos. As histórias envolvendo alquimistas e a famosa pedra filosofal ou as cada vez mais sofisticadas pesquisas com código genético estão aí para provar que independente da época, a morte é o adversário maior que os seres humanos buscam enfrentar, mesmo que não admitam isso.
Quando a humanidade consegue, por fim, vencer a morte, a utopia se faz real e a sociedade perfeita está pronta para emergir. Comandado por uma super inteligência artificial, a Nimbo-Cúmulo, o planeta não precisa mais se preocupar com nenhuma das questões que afligem nosso cotidiano. Todos os problemas foram resolvidos e resta ao homem pura e simplesmente gozar a vida. Eternamente. Ou até o momento em que um ceifador bater à sua porta para provocar sua morte definitiva. Afinal, é preciso um mínimo controle populacional, certo?
Pois bem, essa ideia original, inventiva e que considerei como o melhor livro que li em 2017, se ampliou para um universo ainda maior. Neal Shusterman provou que, diferente de diversos outros autores, tem cacife para bancar uma série de livros sem cair na mesmice, na encheção de linguiça, ou no blábláblá que não faz sentido ou diferença. A Nuvem, segundo volume da série Scythe, não só mantém a qualidade de O Ceifador, como amplia o leque de questões debatidas, trazendo novas perspectivas para uma história que já era pra lá de sensacional.
A fábula inicial que mostrava o homem vencendo a morte e se entregando aos cuidados da “nuvem”, entra em um segundo ato em que essa sociedade perfeita começa a ruir. Ironia maior, justamente a sensação de que tudo era perfeito fez com que ninguém percebesse que, na verdade, não havia perfeição. Por mais inteligente que uma inteligência artificial fosse, ainda assim ela havia sido concebida inicialmente por mãos humanas, que não estão livres de erros. E assim, à medida que acompanhamos uma guerra de defeitos humanos se desenrolar entre os principais personagens da história, a Nimbo-Cúmulo nos presenteia com suas reflexões, um dos pontos mais interessantes e inteligentes da obra.
Se no livro um, Neal Shusterman apresentava o ponto de vista dos Ceifadores, sua tarefa de coletar, seu processo de aprendizagem e sua forma de governo, em A Nuvem, é a Nimbo-Cúmulo que rouba a cena com reflexões que esmiúçam todo o sucesso e fracasso de uma sociedade imortal. Mesmo evoluída e tendo superado seu maior algoz, a morte, a nossa sociedade ainda padece dos mesmos mecanismos que a corrompem. A luta que se desenrola neste livro é motivada por um dos mais velhos defeitos do homem: a ambição pelo poder. Para isso, não há limites. Ainda mais quando os interessados são os únicos que detém o controle da vida.
“A morte deve existir para que a vida tenha sentido”
A partir de um enredo sólido, crível e inteligente, A Nuvem é o segundo ato de uma série que vai esmiuçando características humanas e expondo os podres que impedem uma sociedade de seguir em frente e superar seus defeitos. E isso não é bem uma crítica, afinal fica claro que podemos avançar o quanto for possível, mas jamais vamos fazer com que as fraquezas que compõe a essência do homem desapareçam. Essa é a nossa natureza e dela não podemos fugir, nem mesmo se entregarmos tudo ao controle da inteligência mais inteligente que jamais existiu.
Para além de todas as questões discutidas e esmiuçadas nas entrelinhas de A Nuvem, acompanhamos personagens em seu processo de amadurecimento em que precisam passar por escolhas que não só mudam seus destinos, como também moldam quem serão no futuro. Entre a despedida de alguns e a chegada de novos, sobra aquela réstia de esperança vislumbrada em atos de heroísmo, desprendimento, honra e compaixão. Por pior que possa ser a natureza do homem, existem milhões capazes de não ceder e encontrar caminhos que levem ao almejado final feliz. Por mais que se saiba que ele é tão utópico quanto ser tornar imortal.
A série Scythe segue vigorosa, A Nuvem é um dos melhores livros de 2018, e Neal Shusterman é sem sombra de dúvidas um dos melhores autores YA em atividade no mundo hoje.
Avaliação: 5 Estrelas
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O Autor: Neal Shusterman é autor de vários romances premiados, roteiros para filmes e para animações de TV. Nascido e criado no Brooklyn, em Nova York, atualmente mora no sul da Califórnia. Em 2017, O ceifador foi escolhido livro de honra do Michael L. Printz Award, o principal prêmio de literatura jovem adulta dos Estados Unidos.